O livro “A Batalha de Versalhes” é uma cartilha de moda, uma lição de história e um saboroso relato com personagens verdadeiros, onde quem gosta de moda vai desfrutar da intimidade de designers que costuraram ponto a ponto a história da moda.

Em 1973, o Palácio de Versalhes serviu de cenário para uma das mais importantes batalhas da moda internacional: um duelo de agulhas e linhas entre cinco estilistas franceses e cinco norte-americanos.

O campeão deste evento foi o “american way of life”.

A crítica de moda do Washington Post e vencedora do prêmio Pulitzer, Robin Givhan, narra com detalhes este momento em que estilistas emergentes na época, como Oscar de la Renta e Anne Klein, estabeleceram os Estados Unidos como outra força dominante na moda internacional.

Nos início da década de 1970, a moda, como vários aspectos fundamentais da vida moderna, passava por um momento de transição.

Paris era considerada matriz do bom gosto universal, berço da arte e da alta costura, onde tendências nasciam para serem reproduzidas para o mundo.

O “Made in France” era a única opção nos quesitos de estilo e elegância.

As casas de alta costura francesas lançavam suas criações com estardalhaço, atrizes e socialites adotavam a proposta, as consumidoras desejavam comprar e os varejistas americanos corriam para copiar os modelos “genéricos” a preços acessíveis.

Até esta batalha, gerar novas fórmulas na moda era exclusividade francesa.

Em Nova York, em meio á cópias, emergia uma geração de designers que traduziam com mais realidade os desejos da mulher norte americana, mais prática e na corrida pelos cargos ocupados pelos homens.

Oscar de la Renta, Anne Klein, Stephen Burrows, Halston e Bill Blass faziam parte do time que voou de Nova York para Paris, para o  show no Palácio de Versailles, montado pela publicitária de moda americana Eleanor Lambert, com curadoria de Gerald Van der Kemp.

O objetivo deste desfile era de levantar dinheiro para restaurar a estrutura do Palácio de Versalhes e ao mesmo tempo, proporcionar uma exposição da moda norte-americana.

Olimpíada do bom gosto

Os dois continentes competiam com 80 looks cada um.

Vinte e oito de novembro de 1973 é a data histórica que marcou um gol da moda americana e também a comemoração da diversidade.

Um terço das modelos e um dos estilistas eram afro-americanos, que pela primeira vez participavam de um show tão sofisticado, com uma plateia com Andy Warhol, Elizabeth Taylor e a princesa Grace de Mônaco, entre outras celebridades.

O duelo colocou frente e frente o clássico e o pop e, ao final da noite, lançou o talento norte-americano no mapa-múndi da moda, disputando com os cinco maiores estilistas franceses da época: Christian Dior, Yves Saint Laurent, Hubert de Givenchy, Pierre Cardin e Emanuel Ungaro, referências máximas da alta costura.

Os franceses priorizaram referências seculares da alta-costura, enquanto os americanos apostaram em silhuetas esportivas e casuais.

Egos descontrolados e diversos problemas técnicos e de orçamento quase prejudicaram o esquadrão americano, mas a energia renovadora dos desafiantes, aliada à performance arrebatadora de suas destemidas modelos, ajudaram a alcançar a medalha de ouro, sendo  aplaudidos de pé no final.

A noite que mudou a moda.

Os franceses vieram com seus sets elaborados, culminando numa “caravana gipsy” conduzida por rinocerontes no desfile de Ungaro e com a performance sensual de Josephine Baker que ficou quase nua.

Naquela época os desfiles na França eram tão sérios que aconteciam em silêncio, sem música.

Bem diferente, os americanos apresentaram um show rápido, conciso, com abertura e fechamento feitos por Liza Minelli, que trouxe uma energia completamente nova para o espaço.

Após esta apresentação, o sportswear americano entrou definitivamente no circuito da indústria, tanto que mais tarde até as semanas de moda foram divididas entre “haute couture” e “ready-to-wear”.

No fim da noite, o extravagante evento conseguiu três vezes mais que o orçamento necessário para a reforma do Palácio, calculada na época em US$ 60 milhões.

Mas quem faturou de verdade foi o mercado de moda americano que ficou em pé de igualdade para dividir suas propostas nas vitrines do mundo.

A HBO Films e a diretora Ava DuVernay lançaram um documentário recriando a Batalha. O tema faz sentido para Ava, já que o desfile em Versailles foi um dos primeiros na história a ter modelos negras numa proporção sem precedentes e aborda a questão racial, discussão ainda limitada na moda.

Outro documentário, o “73: American Runway Revolution”, de 2002, da cineasta Deborah Draper Riley conta como este grupo de modelos mudou atitudes, colaborando para a moda americana conseguir chegar ao cenário europeu e mundial.

As modelos que participaram deste histórico desfile se reuniram, para relembrar este marco na história da moda

 

Xico Gonçalves
Xico Gonçalves
Artigos: 850

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

*